A Fábula de Inocêncio, os Sacis vestidos de branco e a Água da Verdade
Autor: Luiz Alberto Quadros Gonsalves, o Poeta Sem Talento
Chovia...chuva fina, fria e com gotículas vermelho carmim.
Inocêncio dormia, tranquilamente, na calçada suja, ao relento, protegido por uma fachada mal em edifício abandonado.
Apesar de tudo o Inocêncio dormia o sono dos justos, envolta em quimeras, devaneios e utopias.
E Inocêncio tinha um amigo; o traficante de sonhos, que vinha quase todos os dias lhe trazer uma dose do elixir das ilusões.
As sombras da sua alma amortecida era a luz de seus olhos fechados.
Subitamente um tremor em seu mundo trágico e cômico...tudo lhe pareceu elevadamente inadequado; e Inocêncio sentiu sede.
E a sede de Inocêncio não era uma sede comum, secura na língua ou sofreguidão no gosto.
Era a sede da verdade, ou, quiçá, a falta de um momento em plena clareza.
Já que Inocêncio nas lidas obscuras estava perdendo o sentido da percepção.
Na sua frente, como se do nada tivesse saído, apareceu um Saci. Não um Saci destes de gorro vermelho, um Saci diferente.
Normalmente os Saci de Gorro vermelho lembram os patriotas da antigas revoluções, que buscavam os direitos iguais e cortavam a cabeças dos seus desiguais.
Este Saci usava o branco. O branco da paz ou das pombas alegres, quando soltas na natureza.
Inocêncio, na sua humildade modesta odiava mostrar-se fraco.
Talvez porque todo o homem quer mostrar que encontra-se em um nível diferente daquele nível em que realmente se encontra-se.
Ou, talvez, porque, mesmo diante de tanta indigência de corpo e alma, Inocêncio tivesse ainda, para si, a necessidade de provar que não perdera, ainda, a sua condição de ser.
- Você, me dê dois goles d'água da verdade.
O Saci vestido de branco, sequer titubeou, verteu para si, em meia volta e saiu...
Ao retornar o Saci vestido de branco trouxe um copo cristalino, com as duas dose da água da verdade.
Inocêncio, ansiado, tomou as duas dose; parou, pensou e...pediu mais um pouco da água da verdade.
O Saci vestido de branco retirou-se, novamente, e no seu retorno voltou com 1 copo cristalino, cheio da água da verdade.
Inocêncio tomou e pediu mais.
O Saci vestido de branco retirou-se, novamente, e no seu retorno voltou com 1 balde, revestido em verde esperança, e o balde estava cheio com a água da verdade.
Inocêncio tomou e pediu mais.
O Saci vestido de branco retirou-se do local, novamente, e no seu retorno voltou com 2 baldes, revestido em verde esperança, da água da verdade.
Achando um desaforo esta atitude, do Saci vestido de branco, Inocêncio deu um tapa no Saci vestido de branco.
Neste momento o Saci vestido de branco retornou com mais dois Saci vestidos, ambos, de branco também.
Um dos Saci vestido de branco, como o primeiro Saci vestido de branco, trazia consigo, como o primeiro Saci vestido de branco, 2 baldes, revestido em verde esperança, ambos cheio da água da verdade.
Inocêncio tomou o liquido dos 4 baldes, revestidos de verde esperança, e, subitamente notou que, um pouco afastado dali, uma multidão caminhava com placas, faixas e cartazes.
Pela distância Inocêncio não conseguia ler o que estava escrito nas faixas, nos cartazes e nem nas placas, que os membros desta multidão carregavam.
Notou, também, o Inocêncio, que o Terceiro Saci vestido de branco lhe oferecia um travesseiro ou uma bota.
A escolha era de Inocêncio.
Se Inocêncio escolhesse o travesseiro, ele poderia voltar a dormir, tranquilamente, como sempre o fizera até então.
Neste caso, Inocêncio jamais saberia o que estaria escrito nas placas, nos cartazes e nas faixas, que os membros da multidão carregavam.
Se Inocêncio escolhesse as botas, ele poderia ir até a multidão e ler o que estaria escrito nas placas, nos cartazes e nas faixas que os membros da multidão carregavam.
Neste caso, Inocêncio, não mais poderia dormir, pois teria que deslocar-se até a multidão, para ler o que estava escrito nas faixas, nas placas e nos cartazes.
E caberia somente a Inocêncio esta escolha.
Moral...
"Após tomar da água da verdade todo o Inocêncio tem a obrigação de fazer alguma escolha. Toda a responsabilidade é intransferível"
Luiz Alberto Quadros Gonsalves, o Poeta Sem Talento
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